DANIEL BOONE EXISTIU


Era um habitante da montanha que, num seriado exposto pela televisão, encantou gerações em todo o mundo, inclusive a minha. Nasceu em Berks Count, Pensilvânia, em 1734, morrendo em 1820. Portanto, entre os nativos norte-americanos, florestas e cidades. “Foi no dia primeiro de maio do ano de 1769 que renunciei temporàriamente à minha felicidade doméstica, deixei a família e a paz do lar às margens do rio Yadkin (seu pai, um ferreiro quaker, se estabeleceu no vale do Yadkin, na Carolina do Norte, onde Boone manteve os seus primeiros contatos com os índios cherokees), para vaguear pelo deserto norte-americano, à procura do país de Kentucky...”. Quem leu a sua autobiografia, logo, logo, há de vislumbrar a saga da colonização americana. Se dizia que ele era um homem de porte físico avantajado, sempre usando como vestimenta o fardamento amarelo-cinzento dos soldados da Revolução de 4 de julho de 1976, contra o domínio inglês, tendo como a sua principal aliada, a burguesia colonial, sedimentando a independência, constituindo os Estados Unidos da América – Massachusettes, Rhod Island, Conecticut, New Hampshire, Nova Jersey, Nova Iorque, Pensilvânia, Delaware, Virgínia, Maryland, Carolina do Sul e Geórgia, sendo, por conseqüência, o primeiro país a possuir e a submeter-se a uma Carta Política escrita.

Boone trilhava a floresta com macieza, “invisivelmente”, como os seus nativos, os índios. Sempre portando um rifle, que dominava como ninguém, com a destreza do bom atirador. Foi, assim, e sempre, que se impunha uma disciplina irreparável, diuturna, de um verdadeiro soldado, levando ao paroxismo as suas aptidões instintivas, principalmente a de defesa, além de uma confiança em si inabalável, tudo isso aliado ao seu vigor físico que o impulsionava ao desbravamento por longas horas.

O pioneiro (havia muitos outros) Daniel Boone, que o político, escritor e historiador Stewart L. Udall disse ser mais valoroso que os camponeses de Jefferson, não era considerado por aquele como um descobridor “no sentido estrito da palavra”, uma vez que outros caçadores e negociadores com os indígenas, haviam penetrado muito antes nas colinas desertas...” E, mais: “A abertura de trilheiras, feita por Boone e outros pioneiros, na década de 1770, representou nota auspiciosa em nossa história, porque coincidiu com os fatos relativos à Revolução.”

Certamente, o que movia as ações de Boone era a sua curiosidade extremada e os seus desejos mais recônditos. Apesar de todos os riscos postos à sua visibilidade, Daniel não se continha, podemos dizer, nem mesmo os queria ver. Pelo contrário, a antevisão de tudo que lhe podia ser contrário a continuar na sua caminhada itinerante, servia-lhe de estímulo para que não se detivesse. Ele sabia que encontraria à sua frente, índios ferozes em florestas virginais, animais com péssima fama, a de dilacerarem tudo que o faro lhes açulasse. Mas, ele tinha, sem dúvida, uma tendência inata para os meandros da geografia, a exemplo de tantos dos seus companheiros de viagem, e, assim, bordava o mapeamento do que aparecia e, também, do contrário, daquilo que ainda não tinha descortinado.

Lá estava Boone, a caminho dos vales do Kentucky, pelos quais, de tudo que se sabe, era um enamorado (ali passou dois invernos), pois, naquela plaga, de clima temperado, tido como o mais saudável da América, sobreexcedia a caça, não havia terrenos pantanosos, e o gado pastaria livre nos campos, sem que nenhum óbice se revelasse hostil. Enfim, só faltava banhar-se em ambrosia, aquela terra do “blue grass” (capim característico do Kentucky).

Diz o historiador Udall, que “escrever era uma habilidade que lhe faltava (a Daniel Boone), daí não dispormos de seu testamento pessoal autêntico sobre suas próprias experiências. De sua biografia, escrita por John Filson, apenas um terço reproduz a verdade.

Daniel Boone não sabia, mas “decisões sobre o futuro desse próspero território [Kentucky] estavam sendo tomadas, e a febre da especulação o envolveu [Boone] no projeto da Transylvania Land Company de, ignorando a Proclamação do Rei, apossar-se de enorme área além das montanhas e plantar nova colônia no deserto.”

Assim, em estação primaveril, Boone partiu com 29 companheiros, “pela estrada do sertão, através da garganta de Cumberland.” Boone, agora, era o agente do progresso e fundador de cidades. Isso aconteceu no ano de 1775. Pelos seus serviços, a Transylvania Land Company lhe outorgou a escritura de 100.000 acres, por ele escolhidos. Mas, Daniel Boone, não era um comerciante, então, abandonou o negócio deslocando-se para o Missouri e aceitando uma doação de terras pelo governador espanhol. À época era chamado de coronel Boone. Também, pela sua natureza, perdeu essa concessão. Mais tarde, novamente lhe sorriu o destino, quando o Congresso americano, reconhecendo os serviços à Pátria, deu-lhe como recompensa 800 acres. Mais uma vez Boone perdeu outra benesse. Devendo, vendeu a área concedida pelo Congresso, quando veio a morrer, com 85 anos, sem terras, sem nada, mas sempre um homem livre, amante dos sertões, verdadeiramente o que deixou a sua marca, a sua herança. O seu neto revelou uma afirmação do velho explorador, interessante e fidelíssima: “Eu preferia possuir uma boa espingarda e dois cães fiéis e atravessar o deserto com um ou dois índios amigos à procura de um rebanho de búfalos ou um bando de homossexual, a possuir parte das terras da cidade ou ser o governador do Estado”.

O seu epitáfio, segundo Udall, está nessa estrofe de Stephen Vincent Beneti:

“Quando Daniel Boone passa, à noite”.
Surge a caça como um fantasma
E Tudo perdido, nos seus olhos
Parece incendiar-se a América primitiva”.

Dessa forma, terminou a saga de Daniel Boone, o indômito índio branco.

Luiz de Carvalho Ramos

Referências:

Udall. Stewart L. - A Crise Silenciosa – A Tragédia do Desmatamento e da Erosão. Título no original THE QUIT CRISIS. Edições O Cruzeiro. Rio de Janeiro.1963, pp. 31 usque 42.

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