As Presenças em Itaparica

Três anos passados da sua Aclamação pelo Senado da Câmara da Cidade do Salvador, ocorrida em 16 de julho de 1823, aporta na Bahia em 28 de fevereiro de 1826, portanto, há 180 anos, D. Pedro I, batizado com o nome de Pedro de Alcântara Francisco Antônio João de Paula Miguel Rafael Joaquim José Gonzaga Pascoal Cipriano Serafim de Bragança e Bourbon, se deslocando para a povoação de Ponta das Baleias, futura sede da Vila de Itaparica, hospedou-se no Solar de Francisco Xavier de Barros Galvão, construído pelo contratador João Francisco de Oliveira, antiga Casa do Contrato das Baleias e futura Pensão Anita, hoje Solar d´El Rey, sede da Secretaria de Turismo. D. Pedro ao ser recebido por Barros Galvão, “herói da Praia Grande”, beijou-lhe a cicatriz que este trazia no seu punho, vestígio honroso das lutas pela Independência do Brasil.

Após os cumprimentos de estilo, o Imperador revistou a Fortaleza de São Lourenço, construída pelos portugueses no século XVIII, visitou a Igreja de São Lourenço, construção barroca de 1610, rezou no Oratório Nossa Senhora da Piedade, padroeira dos heróis de Itaparica, hoje localizada na Praça da Piedade e bebeu a água mineral que vertia, em bicas de bambu, do Alto de Santo Antônio dos Navegantes, canalizada, mais tarde, para a atual “Fonte da Bica”.

O Imperador D. Pedro I despediu-se da Bahia, no dia 19 de março de 1826, “ipsis litteris”:

“Habitantes da Província da Bahia! É chegado o prazo por Mim dado para retirar-se à Corte. Os interesses gerais do Império assim exigem.

Parto no dia vinte e um, como já havia dito, e sinto não poder demorar-me mais entre vós. As demonstrações de alegria, gratidão e fidelidade com que Me mimoseastes, farão com que Eu sempre Me lembre desta Província, assim como Espero, que sempre vos lembreis de Mim, em que tendes um Soberano, que arrosta e arrostará todos os perigos pela Salvação de seus súditos e que busca fazer-se conhecer deles de todos os modos, para que jamais possam ser iludidos e levados ao precipício por aquêles que se intitulam amadores da Pátria e da Liberdade e que só querem despotisar agrilhoando-a, tratando ùnicamente dos seus interesses a despeito da causa pública. O Amôr da Pátria e do Povo tem sido o alvo a que tenho dirigido os meus Tiros; e assim, Baianos, executei literal a constituição. – Cumpri Minhas Imperiais Ordens e o resultado do que vos Ordeno será a vossa felicidade.

Bahia, 19 de março de 1826.

Imperador”

Trinta e três anos depois da visita de D. Pedro I à Itaparica, era a vez do seu filho o Imperador D. Pedro II (1825-1891), batizado Pedro de Alcântara João Carlos Leopoldo Salvador Bibiano Francisco Xavier de Paula Leocádio Miguel Gabriel Rafael Gonzaga de Bourbon Habsburgo e Bragança, que aportou em Itaparica, recebido no Solar da Ponta da Cruz, residência do Comendador José Fernandes de Almeida. Assim, o médico Epiphânio Pedrosa, descreve a chegada de D. Pedro II, ao primeiro torrão insular do Brasil pisado pelo branco europeu, “ipsis litteris”:

“Havia grande cerração e a chuva era extraordinária. Apesar disso S. M. quis saltar o que realizou com grande admiração de todos.

Foi recebido com entusiasmo. Várias pessoas da Vila e da Capital a cuja frente se achava o Juiz Municipal Dr. Bento Fernandes de Almeida, esperavam S. M. no cais para terem a honra de cumprimenta-lo e beijar-lhe a mão.

Girândolas de foguetes subiam constantemente ao ar, e os sinos repicavam sem cessar, como companhando os vivas que de todos os pontos saíam.

S. M. desembarcou em uma ponte puxada ao cais, feita de madeira, forrada de baeta, com grades verdes e amarelas dos lados, enfeitadas com folhas, dando para uma bella escada, que muito facilitou o desembarque, o cais estava coberto de povo. A Guarda Nacional, numerosa como é a de Itaparica, formava alas e saudava o Monarca.

A Câmara Municipal veio recebê-lo com o Pálio, S. M. debaixo de toda a chuva dirigiu-se a capelinha de N. S. da Piedade [onde orara D. Pedro I] onde beijou o Santo Lenho depois descansou por alguns minutos na casa que Dr. Bento lhe havia preparado com todas as conveniências e com o asseio digno da alta personagem que ía hospedar.
Uma mesa magnífica estava servida, sendo notável a profusão e a riqueza dos doces e frutas.

S. M., porém molhado como estava, não se pôde demorar e saudando todos com a sua costumada afabilidade retirou-se prometendo voltar para apreciar os bons sentimentos de que se achavam possuídos, para com sua pessoa, os leais itaparicanos.

O Dr. Bento havia preparado um leito para S. M. no mesmo aposento onde já havia dormido o Sr. D. João VI, naquela mesma casa, onde, mais tarde, passou duas horas o Sr. D. Pedro I. Além dessa coincidência feliz, o Dr. Bento pôde descobrir em poder de uma velha de Nazaré, a cama onde se havia deitado o Sr. D. João VI e o candieiro com que se havia alumiado.

A Cama é de jacarandá, não muito grande e perfeitamente trabalhada. O candieiro é todo de prata, ao gosto antigo com depósito alto cheio de correntes e agulhetas, com bicos para torcida.

Logo que S. M. embarcou na galeota, embarcaram em um saveiro as pessoas mais notáveis que ali se achavam e dirigiram-se ao Apa onde foram benevolamente admitidos a beijar a mão de S. M. a Imperatriz, e onde fizeram suas saudações a S. M. o Imperador”.

Vários itaparicanos ilustres, compareceram à recepção de D. Pedro II, v.g., os professores latinistas Manoel José Pinto e o cônego Francisco Pereira de Souza.

Antônio Frederico de Castro Alves, Castro Alves, o “Cecéu”, chegou à Itaparica em 1867, hospedando-se na rua do Canal, na residência de João de Brito, seu amigo e confidente. Nas areias das praias da ilha, Castro Alves escreveu a poesia “Vozes Misteriosas”, poema que João de Brito ofereceu a Adelaide Guimarães, irmã querida do poeta.

No mesmo ano, 1867, Ruy Barbosa, convalescente de uma enfermidade adquirida em Recife, chegou à Itaparica e hospedou-se na quinta do seu bisavô, o Sargento-Mór de Ordenança, Antônio Barbosa de Oliveira. Ruy Barbosa era advogado, jornalista, jurista, político, diplomata, filólogo, ensaísta e orador. Era amigo e colega de Castro Alves, na Faculdade de Direito do Recife e na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo, escrevendo o ensaio intitulado “Elogio a Castro Alves”.

Luís da Velosa

Referência:

UBALDO OSÓRIO - A ILHA DE ITAPARICA – História e Tradição, IV Ed., 1979.

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